sábado, 9 de outubro de 2010

CAPÍTULO XII - Três interpretações do Apocalipse.

...continuação.

Importante
: O texto a seguir é de autoria do Rev. William J. Grier (1868-19??).


Os intérpretes do Apocalipse podem ser agrupados em três escolas principais, conforme a resposta que dão à pergunta:

"A que período de tempo se referem as visões e acontecimentos do Livro?"
Se respondem:
"ao passado", são preteristas (do Latim - praeter, passado).
Se respondem:
"ao futuro", são futuristas.
Se a resposta é que entendem o Livro como abrangendo, em sua extensão, toda a história do reino de Cristo, eles são o que o Dr. N.B. Stonehouse qualificou de "compreensivistas", isto é, adotam uma interpretação que compreende passado, presente e futuro dentro do escopo do Livro.

1 - O Preterista - sustenta que o livro tem em vista, pelo menos como objetivo principal, acontecimentos contemporâneos do apóstolo João, ou que estavam muito próximos, quando ele o escreveu. Suas profecias foram cumpridas até o tempo de Constantino, i.e., até o começo do quarto século depois de Cristo. Um jesuíta, Alcasar (1614 d.C.) foi o criador dessa escola.

O Apocalipse, a nosso ver, indica com a maior clareza que não se limita aos dias dos Césares. Conforme escreve o Dr. William Milligan:

"Trata de muita cousa que deverá acontecer até o fim dos tempos, até a total realização da luta da Igreja, até a sua completa vitória e a consecução do seu descanso. . . Há um desenvolvimento gradativo no livro, que só termina com o final advento do Juiz de toda a terra."
A interpretação preterista resumiria o Apocalipse a um manual de história da Igreja sob os Césares. É patente, contudo, que a obra tem um alcance muito mais vasto e muito maior utilidade.

2 - O futurista - assegura ser o objetivo do livro - o primordial, pelo menos, descrever os eventos que se centralizam na volta de Cristo. Essa interpretação transfere a verdadeira importância da maior parte do Livro para um período curto, no fim dos tempos (pelo menos na sua interpretação mais estrita). O jesuíta Ribera (1603 d.C.) fundou esta escola. John N. Darby, entre outros, adotou essa interpretação, que está, hoje, muito difundida. Em sua grande maioria, os pré-milenistas são futuristas. Walter Scott, em seu Comentário do Apocalipse, dá a interpretação futurista comum.

"Os capítulos 2 e 3 descrevem a história moral da Igreja em sucessivos períodos, a partir do fim do primeiro século do Cristianismo... Nos capítulos 4 e 5 a cena se passa no céu, e não na terra, tendo os santos sido removidos para o seu lar celestial... Colocamos o arrebatamento dos santos depois da ruína da Igreja, demonstrada no capítulo 3, e antes da glória descrita no capítulo 4."
E continua Scott, dizendo que:
"Os eventos relativos aos selos, às trombetas e às taças da ira se dão após o arrebatamento e antes do aparecimento em glória."
E acrescenta:
"Seria impossível compreender o Apocalipse, se isso não se percebesse claramente."
Como se pode perceber isso claramente, se não existe o menor indício de um "arrebatamento" entre os capítulos 3 e 4 e nenhuma sugestão, em ponto algum, de que as cartas às sete igrejas, que ocupam os capítulos 2 e 3 indicam sete "períodos sucessivos" na história da Igreja?
O Dr. D.G. Barnhouse diz, ao expor o Apocalipse:

"A base para o estudo (ou o seu ponto de partida) é que a maior parte deste livro está inteiramente fora da época da Igreja e que o reajuntamento de Israel é o centro da cena, sendo que a Igreja nem aparece."
Assim, essa surpreendente teoria futurista pede que creiamos não ter o livro do Apocalipse - em sua quase totalidade - coisa alguma a ver com a Igreja, suas lutas, tribulações e triunfos. Philip Mauro, que tinha sido futurista, teve razão ao afirmar que essa teoria...
"... tende a anular o interesse por esse livro maravilhoso, empurrando as suas profecias para muito longe de nós, fazendo que as suas revelações, transcendentemente importantes, pareçam destinar-se a uma outra dispensação que não a nossa, a dispensação chamada 'dos santos em tribulação', desligando-o, assim, do restante da Bíblia."
Mauro acrescenta:
"Há alguns anos, quando levantei essa questão em conversa com um futurista, ele sugeriu que não nos incomodássemos com os 'santos em tribulação' mencionados em um, apenas, dos 66 livros da Bíblia. Mas eu me incomodo, e muito, especialmente por estar firmemente persuadido de que os 'santos em tribulação' da escola futurista são de todo imaginários. Os verdadeiros 'santos em tribulação' somos nós, o povo de Deus desta dispensação (Jo 16:33, At 14:22)."
Seria de muito pequeno conforto, por certo, para os santos do tempo de João, muitos dos quais, como ele próprio, sofrendo sob o imperador Domiciano, receber um livro que tratasse quase que exclusivamente de homens que viriam a existir milênios mais tarde.

3 - O "Compreensivista" - O que adota este ponto de vista afirma que o Livro não trata de um período limitado do reino de Cristo no seu início (conforme diz o preterista) ou no fim (como o futurista), mas abrange toda a história desse reino, desde o primeiro advento até a consumação.

Esse grupo engloba:


a) Escola Histórica da Igreja;

b) Continuidade Histórica;

c) Histórico do Reino.


O primeiro desses grupos considera o livro como apresentando as fases principais da história da Igreja. Esse ponto de vista surgiu nos primeiros séculos da era cristã. Os primeiros escritores a tratar do assunto eram futuristas apenas num ponto: achavam que as visões do Apocalipse estavam começando a se cumprir no tempo deles. Criam que as cousas previstas estavam sendo preparadas nos seus dias e não diziam respeito apenas ao fim. Lutero e os reformadores em geral pertenciam a essa escola e autores posteriores, como o Bispo Wordsworth (1807-1885), seguiram suas pisadas.

O segundo grupo difere do primeiro principalmente por interpretar o livro como História ininterrupta. Não existe, no seu entender, sobreposição de visões: os selos seguem um a outro em sequência cronológica. O sétimo selo abrange as sete trombetas; as trombetas seguem-se uma a outra no tempo e a sétima trombeta abrange as sete taças da ira. Assim, do primeiro selo à sétima taça a História decorre sem interrupção, do princípio ao fim da era cristã. Muitos dos que assim pensam acham que estamos nos dias da sétima taça e, portanto, perto da consumação.

O terceiro grupo é algumas vezes chamado de "simbólico" ou "espiritual" ou, ainda, de "Filosofia Histórica". Parece-nos preferível classificá-lo como a Escola do "Histórico do Reino", que não considera o Apocalipse como um relato contínuo, ininterrupto, da História da Igreja, nem mesmo, num sentido mais estrito, como um sumário dessa História. Toma, porém, o Livro como...

"... tratando do reino de Deus, em toda a sua extensão, do começo ao fim, com o seu desenvolvimento até o grande clímax: a segunda vinda de Cristo." (Dr. Stonehouse).
Esses três pontos de vista, dentro do "Compreensivismo" têm em comum o fato de considerar o Livro como abrangendo toda a história do reino de Cristo. Em seu favor, deve-se dizer que estão de acordo com o restante do Novo Testamento. O Novo Testamento tem uma perspectiva escatológica: traz-nos sempre à mente a vinda do Senhor como a gloriosa esperança. Mas coloca, igualmente, tremenda ênfase no fato estupendo da encarnação do Senhor e na profunda significação de Sua morte, ressurreição e ascensão. Esses eventos foram tão importantes, tão decisivos, que deram início aos "últimos tempos" (Hb 1:1; 9:26, 1ª João 2:18, 1ª Co 10:11) e através deles o povo de Cristo já está de posse da vida eterna e, mesmo agora, já assentado nos lugares celestiais (Ef 2:6).
Em Mt 28:18-20 temos um testemunho claro do valor decisivo da morte e da ressurreição do Senhor. Aí Ele afirmou ter sido investido de autoridade universal, entregou aos discípulos o grande encargo de levar a Sua mensagem a todo o mundo, e prometeu-lhes Sua contínua companhia até a consumação dos séculos. Em 1ª Coríntios 15, também, somos levados à contemplação do reino de Deus consumado (por ex., nos versículos 50-55), porém aí se dá forte ênfase aos fatos de Cristo já estar reinando e abolindo todo império, e potestade, e força, e deve reinar até serem vencidos todos os Seus inimigos, o último dos quais é a morte, que há de ser "tragada na vitória", por ocasião da ressurreição dos santos (vs. 24-26, 54).

É natural encontrar-se no Apocalipse essa mesma ênfase dos outros livros do Novo Testamento - ênfase não apenas no grande acontecimento final, mas também no estabelecimento e na preservação da Igreja antes de tal evento, e na contínua presença de Cristo com ela. É exatamente isso o que se dá.

A visão de Cristo exaltado, no primeiro capítulo, dá a tónica ou, pelo menos, a perspectiva de todo o livro. O Senhor está no meio dos castiçais e declara possuir as chaves da morte e do Inferno. Essa visão se relaciona intimamente às sete cartas dos capítulos 2 e 3 e simultaneamente constitui a introdução do livro todo. Isso se evidencia pelo fato dos principais elementos usados na descrição do Senhor, feita no capítulo 1, serem repetidos não apenas nos capítulos 2 e 3, mas igualmente no 19 (vs. 12, 15 e 21). O Senhor está, portanto, permeando toda a Sua Igreja e governa todas as coisas, tendo as chaves de todos os reinos.

No capítulo 1, vemos o reino de Cristo já presente nos tempos de João, pois o Seu povo pode dizer:

"E nos fez reis e sacerdotes." (v. 6)
João e seus companheiros crentes faziam parte desse reino (v. 9), cujo destino, sem dúvida, muito os preocupava. Sob um imperador que o perseguia, a própria existência desse reino estava ameaçada. A imensa extensão de sua história, cheia de grandes acontecimentos, é então exposta por João, visando a confortar. Recebe ele ordem para escrever sobre "coisas que estão acontecendo e as que depois destas hão de acontecer" (1:19), o que parece indicar que o livro abrange a história completa do reino de Cristo, até a consumação. Apresenta ele persistentemente a gloriosa esperança e o apoteótico fim, mas também é rico em ensinamentos relativos à atual luta do cristão. Incita-o a batalhar corajosamente e o conforta com o pensamento de uma redenção já obtida e do Cordeiro vitorioso já no meio do trono. Em outras palavras, o Apocalipse insiste na imensa importância do que Cristo vai fazer, mas anuncia também as transformações que ocorrerão, no que Ele já fez e continua fazendo.
Se o Livro trata de toda a história do reino de Cristo, não haverá qualquer interrupção nessa história? Parece particularmente claro que sim, no fim do capítulo 11. Nos capítulos 10 e 11, ao som da última das sete trombetas é proclamado que não haverá mais tempo - tudo está consumado e o segredo de Deus terminou, tendo sido recompensados os Seus servos e punidos os ímpios. Em seguida, o capítulo 12 nos leva de volta ao primeiro advento - o nascimento de Cristo e Sua ascensão aos céus. O Prof. Kromminga, um dos mais recentes advogados do ponto de vista da continuidade histórica, reconhece haver nessa passagem uma volta ao início da era cristã. Na realidade, há tantos casos de volta, de recapitulação, bem como de antecipação, e tantos episódios isolados, que consideramos incorreta a interpretação desse segundo grupo (História ininterrupta). É, de fato, impossível colocar os detalhes do Livro no panorama dos acontecimentos da História. A própria diversidade de interpretações entre os adeptos dessa escola testemunha isso. Seria até injusto para com os pobres e incultos que procuram estudar o Apocalipse que fosse correta tal forma de o interpretar. Poucos de nós conhecem bem a história desses dezenove séculos. Não cremos que haja Deus deixado a interpretação do Apocalipse depender do conhecimento da história da Igreja.
O que o Apocalipse apresenta é o grande drama do conflito entre Cristo e o Seu povo de um lado, e Satanás e seus seguidores do outro. Compreende o desenrolar de toda a história do reino de Cristo do princípio da era cristã ao grandioso clímax da segunda vinda.

continua...

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